top of page
Foto do escritorRegina Mota

Um Enfermeiro, Machado de Assis

Atualizado: 20 de ago. de 2021

PARECE-LHE ENTÃO que o que se deu comigo em 1860, pode entrar

numa página de livro? Vá que seja, com a condição única de que não há de

divulgar nada antes da minha morte. Não esperará muito, pode ser que oito

dias, se não for menos; estou desenganado.

Olhe, eu podia mesmo contar-lhe a minha vida inteira, em que há outras

cousas interessantes, mas para isso era preciso tempo, ânimo e papel, e eu só

tenho papel; o ânimo é frouxo, e o tempo assemelha-se à lamparina de

madrugada. Não tarda o sol do outro dia, um sol dos diabos, impenetrável

como a vida. Adeus, meu caro senhor, leia isto e queira-me bem; perdoe-me

o que lhe parecer mau, e não maltrate muito a arruda, se lhe não cheira a

rosas. Pediu-me um documento humano, ei-lo aqui. Não me peça também o

império do Grão-Mogol, nem a fotografia dos Macabeus; peça, porém, os

meus sapatos de defunto e não os dou a ninguém mais.

Já sabe que foi em 1860. No ano anterior, ali pelo mês de agosto, tendo eu

quarenta e dois anos, fiz-me teólogo, — quero dizer, copiava os estudos de

teologia de um padre de Niterói, antigo companheiro de colégio, que assim

me dava, delicadamente, casa, cama e mesa. Naquele mês de agosto de

1859, recebeu ele uma carta de um vigário de certa vila do interior,

perguntando se conhecia pessoa entendida, discreta e paciente, que quisesse

ir servir de enfermeiro ao coronel

Felisberto, mediante um bom ordenado. O padre falou-me, aceitei com

ambas as mãos, estava já enfarado de copiar citações latinas e fórmulas

eclesiásticas. Vim à Corte despedir-me de um irmão, e segui para a vila.

Chegando à vila, tive más notícias do coronel. Era homem insuportável,

estúrdio, exigente, ninguém o aturava, nem os próprios amigos. Gastava

mais enfermeiros que remédios. A dous deles quebrou a cara. Respondi que

não tinha medo de gente sã, menos ainda de doentes; e depois de entenderme

com o vigário, que me confirmou as notícias recebidas, e me

recomendou mansidão e caridade, segui para a residência do coronel.

Achei-o na varanda da casa estirado numa cadeira, bufando muito. Não

me recebeu mal. Começou por não dizer nada; pôs em mim dous olhos de

gato que observa; depois, uma espécie de riso maligno alumiou-lhe as

feições, que eram duras. Afinal, disse-me que nenhum dos enfermeiros que

tivera, prestava para nada, dormiam muito, eram respondões e andavam ao

faro das escravas; dous eram até gatunos!

— Você é gatuno?

— Não, senhor.

Em seguida, perguntou-me pelo nome: disse-lho e ele fez um gesto de

espanto. Colombo? Não, senhor: Procópio José Gomes Valongo. Valongo?

achou que não era nome de gente, e propôs chamar-me tão-somente

Procópio, ao que respondi que estaria pelo que fosse de seu agrado. Contolhe

esta particularidade, não só porque me parece pintá-lo bem, como porque

a minha resposta deu de mim a melhor idéia ao coronel. Ele mesmo o

declarou ao vigário, acrescentando que eu era o mais simpático dos

enfermeiros que tivera. A verdade é que vivemos uma lua-de-mel de sete

dias.

No oitavo dia, entrei na vida dos meus predecessores, uma vida de cão,

não dormir, não pensar em mais nada, recolher injúrias, e, às vezes, rir delas,

com um ar de resignação e conformidade; reparei que era um modo de lhe

fazer corte. Tudo impertinências de moléstia e do temperamento. A moléstia

era um rosário delas, padecia de aneurisma, de reumatismo e de três ou

quatro afecções menores. Tinha perto de sessenta anos, e desde os cinco toda

a gente lhe fazia a vontade. Se fosse só

rabugento, vá; mas ele era também mau, deleitava-se com a dor e a

humilhação dos outros. No fim de três meses estava farto de o aturar;

determinei vir embora; só esperei ocasião.

Não tardou a ocasião. Um dia, como lhe não desse a tempo uma

fomentação, pegou da bengala e atirou-me dous ou três golpes. Não era

preciso mais; despedi-me imediatamente, e fui aprontar a mala. Ele foi ter

comigo, ao quarto, pediu-me que ficasse, que não valia a pena zangar por

uma rabugice de velho. Instou tanto que fiquei.

— Estou na dependura, Procópio, dizia-me ele à noite; não posso viver

muito tempo. Estou aqui, estou na cova. Você há de ir ao meu enterro,

Procópio; não o dispenso por nada. Há de ir, há de rezar ao pé da minha

sepultura. Se não for, acrescentou rindo, eu voltarei de noite para lhe puxar

as pernas. Você crê em almas de outro mundo, Procópio?

— Qual o quê!

— E por que é que não há de crer, seu burro? redargüiu vivamente,

arregalando os olhos.

Eram assim as pazes; imagine a guerra. Coibiu-se das bengaladas; mas as

injúrias ficaram as mesmas, se não piores. Eu, com o tempo, fui calejando, e

não dava mais por nada; era burro, camelo, pedaço d’asno, idiota, moleirão,

era tudo. Nem, ao menos, havia mais gente que recolhesse uma parte desses

nomes. Não tinha parentes; tinha um sobrinho que morreu tísico, em fins de

maio ou princípios de julho, em Minas. Os amigos iam por lá às vezes

aprová-lo, aplaudi-lo, e nada mais; cinco, dez

minutos de visita. Restava eu; era eu sozinho para um dicionário inteiro.

Mais de uma vez resolvi sair; mas, instado pelo vigário, ia ficando.

Não só as relações foram-se tornando melindrosas, mas eu estava ansioso

por tornar à Corte. Aos quarenta e dois anos não é que havia de acostumarme

à reclusão constante, ao pé de um doente bravio, no interior. Para avaliar

o meu isolamento, basta saber que eu nem lia os jornais; salvo alguma

notícia mais importante que levavam ao coronel, eu nada sabia do resto do

mundo. Entendi, portanto, voltar para a Corte, na primeira ocasião, ainda

que tivesse de brigar com o vigário. Bom é dizer

(visto que faço uma confissão geral) que, nada gastando e tendo guardado

integralmente os ordenados, estava ansioso por vir dissipá-los aqui.

Era provável que a ocasião aparecesse. O coronel estava pior, fez

testamento, descompondo o tabelião, quase tanto como a mim. O trato era

mais duro, os breves lapsos de sossego e brandura faziam-se raros. Já por

esse tempo tinha eu perdido a escassa dose de piedade que me fazia esquecer

os excessos do doente; trazia dentro de mim um fermento de ódio e aversão.

No princípio de agosto resolvi definitivamente sair; o vigário e o médico,

aceitando as razões, pediram-me que ficasse algum tempo mais. Concedilhes

um mês; no fim de um mês viria embora, qualquer que fosse o estado

do doente. O vigário tratou de procurar-me substituto.

Vai ver o que aconteceu. Na noite de vinte e quatro de agosto, o coronel

teve um acesso de raiva, atropelou-me, disse-me muito nome cru, ameaçoume

de um tiro, e acabou atirando-me um prato de mingau, que achou frio, o

prato foi cair na parede onde se fez em pedaços.

— Hás de pagá-lo, ladrão! bradou ele.

Resmungou ainda muito tempo. Às onze horas passou pelo sono.

Enquanto ele dormia, saquei um livro do bolso, um velho romance de

d’Arlincourt, traduzido, que lá achei, e pus-me a lê-lo, no mesmo quarto, a

pequena distância da cama; tinha de acordá-lo à meia-noite para lhe dar o

remédio. Ou fosse de cansaço, ou do livro, antes de chegar ao fim da

segunda página adormeci também. Acordei aos gritos do coronel, e levanteime

estremunhado. Ele, que parecia delirar, continuou nos

mesmos gritos, e acabou por lançar mão da moringa e arremessá-la contra

mim. Não tive tempo de desviar-me; a moringa bateu-me na face esquerda, e

tal foi a dor que não vi mais nada; atirei-me ao doente, pus-lhe as mãos ao

pescoço, lutamos, e esganei-o.

Quando percebi que o doente expirava, recuei aterrado, e dei um grito;

mas ninguém me ouviu. Voltei à cama, agitei-o para chamá-lo à vida, era

tarde; arrebentara o aneurisma, e o coronel morreu. Passei à sala contígua, e

durante duas horas não ousei voltar ao quarto. Não posso mesmo dizer tudo

o que passei, durante esse tempo. Era um atordoamento, um delírio vago e

estúpido. Parecia-me que as paredes tinham vultos; escutava umas vozes

surdas. Os gritos da vítima, antes da luta e durante a luta, continuavam a

repercutir dentro de mim, e o ar, para onde quer que me voltasse, aparecia

recortado de convulsões. Não creia que esteja fazendo imagens nem estilo;

digo-lhe que eu ouvia distintamente umas vozes que me bradavam:

assassino! assassino!

Tudo o mais estava calado. O mesmo som do relógio, lento, igual e seco,

sublinhava o silêncio e a solidão. Colava a orelha à porta do quarto na

esperança de ouvir um gemido, uma palavra, uma injúria, qualquer coisa que

significasse a vida, e me restituísse a paz à consciência. Estaria pronto a

apanhar das mãos do coronel, dez, vinte, cem vezes. Mas nada, nada; tudo

calado. Voltava a andar à toa na sala, sentava-me, punha as mãos na cabeça;

arrependia-me de ter vindo. — "Maldita a hora

em que aceitei semelhante coisa!" exclamava. E descompunha o padre de

Niterói, o médico, o vigário, os que me arranjaram um lugar, e os que me

pediram para ficar mais algum tempo. Agarrava-me à cumplicidade dos

outros homens.

Como o silêncio acabasse por aterrar-me, abri uma das janelas, para

escutar o som do vento, se ventasse. Não ventava. A noite ia tranqüila, as

estrelas fulguravam, com a indiferença de pessoas que tiram o chapéu a um

enterro que passa, e continuam a falar de outra coisa. Encostei-me ali por

algum tempo, fitando a noite, deixando-me ir a uma recapitulação da vida, a

ver se descansava da dor presente. Só então posso dizer que pensei

claramente no castigo. Achei-me com um crime às costas e vi a punição

certa. Aqui o temor complicou o remorso. Senti que os cabelos me ficavam

de pé. Minutos depois, vi três ou quatro vultos de pessoas, no terreiro

espiando, com um ar de emboscada; recuei, os vultos esvaíram-se no ar; era

uma alucinação.

Antes do alvorecer curei a contusão da face. Só então ousei voltar ao

quarto. Recuei duas vezes, mas era preciso e entrei; ainda assim, não

cheguei logo à cama. Tremiam-me as pernas, o coração batia-me; cheguei a

pensar na fuga; mas era confessar o crime, e, ao contrário, urgia fazer

desaparecer os vestígios dele. Fui até a cama; vi o cadáver, com os olhos

arregalados e a boca aberta, como deixando passar a eterna palavra dos

séculos: "Caim, que fizeste de teu irmão?" Vi no

pescoço o sinal das minhas unhas; abotoei alto a camisa e cheguei ao queixo

a ponta do lençol. Em seguida, chamei um escravo, disse-lhe que o coronel

amanhecera morto; mandei recado ao vigário e ao médico.

A primeira idéia foi retirar-me logo cedo, a pretexto de ter meu irmão

doente, e, na verdade, recebera carta dele, alguns dias antes, dizendo-me que

se sentia mal. Mas adverti que a retirada imediata poderia fazer despertar

suspeitas, e fiquei. Eu mesmo amortalhei o cadáver, com o auxílio de um

preto velho e míope. Não saí da sala mortuária; tinha medo de que

descobrissem alguma cousa. Queria ver no rosto dos outros se

desconfiavam; mas não ousava fitar ninguém. Tudo me dava

impaciências: os passos de ladrão com que entravam na sala, os cochichos,

as cerimônias e as rezas do vigário. Vindo a hora, fechei o caixão, com as

mãos trêmulas, tão trêmulas que uma pessoa, que reparou nelas, disse a

outra com piedade:

— Coitado do Procópio! apesar do que padeceu, está muito sentido.

Pareceu-me ironia; estava ansioso por ver tudo acabado. Saímos à rua. A

passagem da meia escuridão da casa para a claridade da rua deu-me grande

abalo; receei que fosse então impossível ocultar o crime. Meti os olhos no

chão, e fui andando. Quando tudo acabou, respirei. Estava em paz com os

homens. Não o estava com a consciência, e as primeiras noites foram

naturalmente de desassossego e aflição. Não é preciso dizer que vim logo

para o Rio de Janeiro, nem que vivi aqui aterrado, embora longe do crime;

não ria, falava pouco, mal comia, tinha alucinações, pesadelos...

— Deixa lá o outro que morreu, diziam-me. Não é caso para tanta

melancolia.

E eu aproveitava a ilusão, fazendo muitos elogios ao morto, chamando-lhe

boa criatura, impertinente, é verdade, mas um coração de ouro. E elogiando,

convencia-me também, ao menos por alguns instantes. Outro fenômeno

interessante, e que talvez lhe possa aproveitar, é que, não sendo religioso,

mandei dizer uma missa pelo eterno descanso do coronel, na igreja do

Sacramento. Não fiz convites, não disse nada a ninguém; fui ouvi-la,

sozinho, e estive de joelhos todo o tempo, persignando-me a miúdo. Dobrei

a espórtula do padre, e distribuí esmolas à porta, tudo por intenção do

finado. Não queria embair os homens; a prova é que fui só. Para completar

este ponto, acrescentarei que nunca aludia ao coronel, que não dissesse:

"Deus lhe fale n’alma!" E contava dele algumas anedotas alegres, rompantes

engraçados...

Sete dias depois de chegar ao Rio de Janeiro, recebi a carta do vigário,

que lhe mostrei, dizendo-me que fora achado o testamento do coronel, e que

eu era o herdeiro universal. Imagine o meu pasmo. Pareceu-me que lia mal,

fui a meu irmão, fui aos amigos; todos leram a mesma cousa. Estava escrito;

era eu o herdeiro universal do coronel. Cheguei a supor que fosse uma

cilada; mas adverti logo que havia outros meios de capturar-me, se o crime

estivesse descoberto. Demais, eu conhecia a

probidade do vigário, que não se prestaria a ser instrumento. Reli a carta,

cinco, dez, muitas vezes; lá estava a notícia.

— Quanto tinha ele? perguntava-me meu irmão.

— Não sei, mas era rico.

— Realmente, provou que era teu amigo.

— Era... Era...

Assim por uma ironia da sorte, os bens do coronel vinham parar às

minhas mãos. Cogitei em recusar a herança. Parecia-me odioso receber um

vintém do tal espólio; era pior do que fazer-me esbirro alugado. Pensei nisso

três dias, e esbarrava sempre na consideração de que a recusa podia fazer

desconfiar alguma cousa. No fim dos três dias, assentei num meio-termo;

receberia a herança e dá-la-ia toda, aos bocados e às escondidas. Não era só

escrúpulo; era também o modo de resgatar

o crime por um ato de virtude; pareceu-me que ficava assim de contas

saldas.

Preparei-me e segui para a vila. Em caminho, à proporção que me ia

aproximando, recordava o triste sucesso; as cercanias da vila tinham um

aspecto de tragédia, e a sombra do coronel parecia-me surgir de cada lado. A

imaginação ia reproduzindo as palavras, os gestos, toda a noite horrenda do

crime...

Crime ou luta? Realmente, foi uma luta, em que eu, atacado, defendi-me,

e na defesa... Foi uma luta desgraçada, uma fatalidade. Fixei-me nessa idéia.

E balanceava os agravos, punha no ativo as pancadas, as injúrias... Não era

culpa do coronel, bem o sabia, era da moléstia, que o tornava assim

rabugento e até mau... Mas eu perdoava tudo, tudo... O pior foi a fatalidade

daquela noite... Considerei também que o coronel não podia viver muito

mais; estava por pouco; ele mesmo o sentia e dizia. Viveria quanto? Duas

semanas, ou uma; pode ser até que menos. Já não era vida, era um molambo

de vida, se isto mesmo se podia chamar ao padecer contínuo do pobre

homem... E quem sabe mesmo se a luta e a morte não foram apenas

coincidentes? Podia ser, era até o mais provável; não foi outra cousa. Fixeime

também nessa idéia...

Perto da vila apertou-se-me o coração, e quis recuar; mas dominei-me e

fui. Receberam-me com parabéns. O vigário disse-me as disposições do

testamento, os legados pios, e de caminho ia louvando a mansidão cristã e o

zelo com que eu servira ao coronel, que, apesar de áspero e duro, soube ser

grato.

— Sem dúvida, dizia eu olhando para outra parte.

Estava atordoado. Toda a gente me elogiava a dedicação e a paciência. As

primeiras necessidades do inventário detiveram-me algum tempo na vila.

Constituí advogado; as cousas correram placidamente. Durante esse tempo,

falava muita vez do coronel. Vinham contar-me cousas dele, mas sem a

moderação do padre; eu defendia-o, apontava algumas virtudes, era

austero...

— Qual austero! Já morreu, acabou; mas era o diabo.

E referiam-me casos duros, ações perversas, algumas extraordinárias.

Quer que lhe diga? Eu, a princípio, ia ouvindo cheio de curiosidade; depois,

entrou-me no coração um singular prazer, que eu sinceramente buscava

expelir. E defendia o coronel, explicava-o, atribuía alguma coisa às

rivalidades locais; confessava, sim, que era um pouco violento... Um pouco?

Era uma cobra assanhada, interrompia-me o barbeiro; e todos, o coletor, o

boticário, o escrivão, todos diziam a mesma coisa; e

vinham outras anedotas, vinha toda a vida do defunto. Os velhos

lembravam-se das crueldades dele, em menino. E o prazer íntimo, calado,

insidioso, crescia dentro de mim, espécie de tênia moral, que por mais que a

arrancasse aos pedaços recompunha-se logo e ia ficando.

As obrigações do inventário distraíram-me; e por outro lado a opinião da

vila era tão contrária ao coronel, que a vista dos lugares foi perdendo para

mim a feição tenebrosa que a princípio achei neles. Entrando na posse da

herança, converti-a em títulos e dinheiro. Eram então passados muitos

meses, e a idéia de distribuí-la toda em esmolas e donativos pios não me

dominou como da primeira vez; achei mesmo que era afetação. Restringi o

plano primitivo: distribuí alguma cousa aos pobres, dei à matriz da vila uns

paramentos novos, fiz uma esmola à Santa Casa da Misericórdia, etc.: ao

todo trinta e dous contos. Mandei também levantar um túmulo ao coronel,

todo de mármore, obra de um napolitano, que aqui esteve até 1866, e foi

morrer, creio eu, no Paraguai.

Os anos foram andando, a memória tornou-se cinzenta e desmaiada.

Penso às vezes no coronel, mas sem os terrores dos primeiros dias. Todos os

médicos a quem contei as moléstias dele, foram acordes em que a morte era

certa, e só se admiravam de ter resistido tanto tempo. Pode ser que eu,

involuntariamente, exagerasse a descrição que então lhes fiz; mas a verdade

é que ele devia morrer, ainda que não fosse aquela fatalidade...

Adeus, meu caro senhor. Se achar que esses apontamentos valem alguma

coisa, pague-me também com um túmulo de mármore, ao qual dará por

epitáfio esta emenda que faço aqui ao divino sermão da montanha: "Bemaventurados

os que possuem, porque eles serão consolados."

FIM

Fonte:

ASSIS, Machado de. Obra Completa. Rio de Janeiro : Nova Aguilar 1994. v. II.

Texto proveniente de:

A Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro <http://www.bibvirt.futuro.usp.br>

A Escola do Futuro da Universidade de São Paulo

Permitido o uso apenas para fins educacionais.

Texto-base digitalizado por:

Núcleo de Pesquisas em Informática, Literatura e Lingüística

(http://www.cce.ufsc.br/~nupill/literatura/literat.html)

Este material pode ser redistribuído livremente, desde que não seja alterado, e que as

informações acima sejam mantidas. Para maiores informações, escreva para

<bibvirt@futuro.usp.br>.

Estamos em busca de patrocinadores e voluntários para nos ajudar a manter este projeto. Se você quer

ajudar de alguma forma, mande um e-mail para <bibvirt@futuro.usp.br> e saiba como isso é possível.

40 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

コメント


bottom of page